Flexibilização da Lei Kiss vira polêmica e entidades cogitam acionar a Justiça

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Entidades profissionais de arquitetos e engenheiros criticam a aprovação do projeto de lei complementar que promoveu flexibilizações na Lei Kiss para a emissão do alvará do Corpo de Bombeiros Militar (CBM). A principal modificação é a “dispensa” desta autorização, chamada hoje de Certificado de Licenciamento do Corpo de Bombeiros (CLCB), para empreendimentos e edificações classificadas como de baixo risco de incêndio. Isso alcança bares, restaurantes e escolas, por exemplo, desde que atendidas uma série de critérios, como ter área total de até 200 metros quadrados.

O governo estadual diz que a liberação do alvará alcança “ao redor” de 730 CNAEs (Classificação Nacional de Atividades Econômicas). Já o Sindicato dos Arquitetos do Estado do Rio Grande do Sul (Saergs) estima que são até 679 CNAEs liberados da emissão do CLCB.

A norma foi elaborada pelo governo estadual e tramitou em regime de urgência na Assembleia, instrumento que força a apreciação em 30 dias. Os deputados estaduais aprovaram a matéria, no dia 22 de novembro, por 39 votos favoráveis e sete contrários. Para virar lei, falta apenas a sanção do governador Ranolfo Vieira Júnior. Associações classistas pressionam pelo veto do chefe do Executivo, o que parece improvável, e cogitam a hipótese de ingressar na Justiça com uma ação civil pública para tentar barrar a norma.

 

Riscos

 

As entidades dizem que as novas regras colocam em risco a integridade dos frequentadores dos ambientes e avaliam que, ao dispensar o responsável de fazer um protocolo nos bombeiros e apresentar informações básicas, será causado um apagão de informações. Os bombeiros, pela interpretação das entidades, ficarão sem acesso aos dados dos novos empreendimentos e, em caso de necessidade de uma fiscalização ou investigação de um sinistro, começarão no escuro. Isso é rebatido pelo governo, conforme detalhado no trecho final da reportagem.

No modelo atual, empreendedores de atividades de baixo risco precisam ingressar no sistema dos bombeiros e fazer uma autodeclaração em que prestam informações sobre a edificação. Eles apontam o responsável e se comprometem com os padrões mínimos de prevenção e combate a incêndio. O alvará costuma ser emitido entre dois a cinco dias e uma vistoria dos bombeiros não é necessária, embora possa ocorrer a qualquer momento, por amostragem. Esse procedimento está sendo desobrigado para a classificação de baixo risco.

— Até então, os bombeiros pelo menos sabiam que iria ser aberta uma edificação de 200 metros quadrados e de determinadas características. Agora, não vai ter essa informação. Qualquer investigação de sinistro vai ficar prejudicada — diz Evandro Medeiros, presidente do Saergs.

A nova norma tem quatro itens que definem o empreendedor como responsável solidário por providenciar medidas de segurança contra incêndio, com a instalação de equipamentos e garantia de pessoal treinado. Ele ainda tem o dever de providenciar o licenciamento mais rigoroso junto aos bombeiros em caso de a atividade econômica ser modificada para outra classificação que não seja a de risco baixo.

“O que essa lei faz é promover a boa-fé. A gente entende que a boa-fé não é suficiente para garantir a segurança dos usuários das edificações. O Estado não poderia se omitir”, avalia Medeiros.

Presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio Grande do Sul (CAU-RS), Tiago Holzmann da Silva é contundente ao lembrar a tragédia da boate Kiss, que vitimou 242 pessoas em Santa Maria em 2013: — É um desmonte da legislação em nome de um alegado desenvolvimento econômico. A verdadeira motivação é economizar e não gastar em prevenção de incêndio e na segurança das pessoas. Estamos alertando que haverá novas tragédias e os grandes responsáveis serão o governo estadual, a Assembleia Legislativa e as entidades empresariais.

 

Autodeclarações

 

O tema, complexo por natureza, potencializou divergências interpretativas com o envio à Assembleia de um texto truncado. Embora o Palácio Piratini garanta que a dispensa do alvará vale apenas para classificações de risco baixo de incêndio, um trecho do inciso segundo cita também as classificações de grau médio.

Secretário de Planejamento, Governança e Gestão, Claudio Gastal tem análise completamente oposta à dos críticos, diz que está havendo uma “mistura de assuntos” e assegura que informações sobre as características dos imóveis e atividades econômicas continuarão sendo prestadas. A única diferença, diz ele, é que todo o processo de licenciamento será feito em um mesmo sistema, valendo para os alvarás de bombeiros, meio ambiente e vigilância sanitária, em um método de desburocratização. Gastal sustenta que a essência do processo não mudou e que apenas houve uma facilitação. Ele ainda afirma que a mudança da Lei Kiss atende a determinação da lei de liberdade econômica federal, especificamente no trecho que libera de licenças de qualquer natureza os empreendimentos de baixo risco.

“Em vez de a pessoa entrar em três ou quatro sistemas, ela entra em um só e emite a autorização necessária”, pontua Gastal.

Ele diz que, em vez de entrar na ferramenta dos bombeiros para emitir o CLCB, o responsável irá ingressar no Tudo Fácil Empresas e terá de responder perguntas semelhantes à do modelo que está sendo substituído e fazer a autodeclaração. Ao final, essa autorização terá validade para os bombeiros, embora não tenha o nome de CLCB. O sistema Tudo Fácil Empresas está operando em 12 municípios gaúchos, sobretudo os mais populosos, como Porto Alegre e Caxias do Sul. Gastal diz que os bombeiros estão conectados a esse sistema e têm acesso a todas as informações em tempo real. Nas demais cidades, os responsáveis terão de usar outro sistema para emitir a autorização, o RedeSim. Os bombeiros estão em processo de conexão com esse sistema, diz Gastal. Enquanto isso não ocorre, eles terão de solicitar as informações que desejam à Junta Comercial, Industrial e Serviços do Rio Grande do Sul (Jucis-RS).

“Os sistemas (Tudo Fácil Empresas e RedeSim) têm os mesmos questionamentos do Corpo de Bombeiros. Se não é baixo risco, o sistema retira do processo. Não tem nada às cegas. Tudo está online e disponível. O que há é uma certa discussão de leis que privilegiam algum segmento ou corporação”, avalia Gastal.

Embora o secretário assegure que os mesmos procedimentos feitos no sistema dos bombeiros continuarão a ser exigidos, isso não é abordado na legislação aprovada, cujo texto fala em “dispensa de alvará” para atividades em área total de até 200 metros quadrados e com classificação de baixo risco de incêndio.

O diretor do Departamento de Segurança, Prevenção e Proteção contra Incêndio do CBM, o coronel Alexandre Pires Bittencourt confirma que o órgão atuou na formulação das perguntas que serão feitas aos autodeclarantes quando acessarem os sistemas Tudo Fácil Empresas e RedeSim para buscarem o enquadramento de baixo risco.

“O cidadão vai responder os questionários e a inteligência artificial é que vai colocar ele como atividade de baixo risco. Ele vai receber uma informação dizendo que não é necessário o licenciamento (CLCB), mas que ele é responsável pelas medidas básicas de segurança. No Tudo Fácil Empresas, será o mesmo modus operandi que temos hoje. Com relação ao RedeSim, vai demandar o fornecimento de listagens pela Junta Comercial para as fiscalizações por amostragens que são realizadas — detalhou Bittencourt.

 

 

Fonte: GHZ

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