Fenômenos climáticos impulsionam estratégias para combate de incêndios
Sabemos que os fenômenos climáticos estão em grande precipitação nos últimos anos, como chuvas intensas e calor extremo em muitas partes do globo. Em julho, por exemplo, uma delegação de 21 servidores brasileiros,incluindo bombeiros militares do Distrito Federal e de diversos estados, entre os quais Bahia, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e São Paulo, foi deslocada para o Canadá, que está sofrendo com os incêndios florestais que devastam o país.
Um dos impactos sentidos pelas mudanças do clima, e que se agravam inclusive pela ação humana, como as queimadas indiscriminadas, são os fenômenos El Niño e La Niña. “O atual evento El Niño, com pico entre dezembro de 2023 e janeiro de 2024, afetará particularmente Chile, Peru e Equador devido à diminuição das populações de peixes, que podem causar escassez de alimentos e uma tendência de queda nas exportações. O aumento da precipitação é outro efeito esperado, levando a possíveis deslizamentos de terra e inundações. As chances deste El Niño se tornar um evento forte em seu pico são altas, em 56%, com 84% de chance de ser pelo menos um evento moderado”, informa comunicado da Meteum, plataforma que usa Inteligência Artificial para previsão global de tempo e clima.
Fenômenos climáticos
Segundo a plataforma, a previsão para o inverno brasileiro será de temperaturas em elevação, sendo uma das manifestações do fenômeno. “Com os processos de intensificação da mudança climática induzidos pelo homem, onde se encaixa o El Niño, espera-se que a costa oeste da América do Sul tenha chuvas intensas, necessitando de proteção de cultivos e um risco aumentado de formação de furacões. Por outro lado, a região amazônica provavelmente ficará mais quente e seca, levando à redução da produção agrícola, aumento dos riscos de incêndios e secas severas na Colômbia e na América Central”, acrescenta a Meteum.
Capacitação
A cada ano, o Brasil queima uma área equivalente a Inglaterra. A triste estimativa é do MapBiomas, após analisar imagens de satélite entre 1985 e 2020, e dos cinco biomas, o mais atingido é o Pantanal: 57% de seu território foi queimado ao menos uma vez entre os anos analisados. Um dos agravantes está na vegetação campestre, que é a mais afetada no bioma, já que durante os períodos úmidos as plantas acumulam biomassa e nos secos, o mato torna-se combustível para incêndios. “Essas características, associadas a eventos climáticos de seca e fortes ventos, torna o fogo um problema a ser controlado. Questões relativas ao uso do fogo como forma de manejo, em condições inadequadas, podem levar a ocorrência de incêndios descontrolados por extensas áreas”, alerta Eduardo Reis Rosa, coordenador do MapBiomas Pantanal.
Uma das atitudes para mitigar tal problema está na conscientização e treinamento de pessoal. Minas Gerais está reforçando as ações de combate, com um programa inédito de capacitação e formação de brigadas municipais. Em entrevista a FM O Tempo 91,7, em julho, Marília Carvalho de Melo, secretária de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) de Minas, disse que o programa está sendo implantado em 40 cidades que contam com unidades de conservação estaduais com registro de incêndio ou que originaram, entre 2013 e 2021, ocorrência com fogo. “Houve uma doação de equipamentos básicos de combate para os municípios. A Defesa Civil e o Corpo de Bombeiros entram com a capacitação das defesas civis municipais em apoio a esse trabalho”, afirmou. Por conta o El Niño, o período de estiagem em 2023 poderá ser prolongado no estado. Corte de vegetação antes do período crítico de seca e educação socioambiental são as práticas aplicadas, esclareceu Marília. “Fazemos um trabalho de educação ambiental com a comunidade do entorno porque a maioria dos incêndios florestais tem ação humana”, arrematou.
Aliados
Além do treinamento de pessoal, a tecnologia é uma aliada quando o assunto é combate a incêndios e previsão meteorológica. A NASA, a agência espacial americana, anunciou ampliar parceria com o Brasil para monitoramento de desmatamento na Amazônia: “Os nossos satélites já mandam muitas imagens e informações aos cientistas aqui no Brasil para localizar a destruição da floresta”, afirmou Bill Nelson, administrador da agência, em coletiva de imprensa após encontro com o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, em julho.
Já em abril, o Google promoveu em Belém, PA, o evento “Sustentabilidade com o Google – Amazônia”, que teve como foco o lançamento de soluções como o uso da Inteligência Artificial no monitoramento do desmatamento e alertar sobre incêndios florestais. “A IA do Google também será usada para detectar e alertar, na Busca e no Google Maps, sobre possíveis desastres na região. Para isso, a empresa atuará em parceria com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e o Serviço Geológico do Brasil (CPRM). Os alertas de incêndios contam com IA que usa imagens de satélite para detectar estágios iniciais de queimadas. Essa detecção inicial torna a contenção do incêndio mais fácil, podendo reduzir seu impacto e evitar a liberação de grandes quantidades de CO2 na atmosfera”, informou Bia Mori, gerente de Parcerias da área de impacto social do Google, no blog para big tech.
Essa, porém, é a ponta do iceberg do oceano de articulações necessárias para enfrentamento dessas questões do clima, que precisam ser aplicadas com celeridade. Erika Berenguer, bióloga brasileira, pesquisadora das universidades de Oxford e Lancaster, ambas no Reino Unido, disse à BBC, que o evento pode causar já neste ano uma “hecatombe ambiental” na Amazônia, já que o fenômeno tem como característica a seca extrema causada pelo El Niño, podendo culminar em grandes problemas em meio à devastação do bioma nos últimos anos, com altos índices de desmatamento e incêndios enfrentados nos últimos anos. “Eu passei meses na Amazônia em 2015 e foi traumático olhar tudo aquilo. Eram milhares de áreas de floresta queimando e isso dava uma sensação de impotência. Tenho muito medo porque se acontecer algo semelhante agora, após tanto desmatamento, o El Niño pode causar uma verdadeira hecatombe ambiental”, lamentou a bióloga.
Rodrigo Agostinho, presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), afirmou à reportagem que as principais medidas para reduzir os danos estão a fiscalização intensa sobre o fogo na região, em especial nas consideradas menos úmidas, além de alertas à população sobre os riscos de incêndios no período de seca.“A previsão é de um aumento de aproximadamente 18% de brigadistas em relação a 2022, com atuação de 2.101. Destes, 1.385 atuarão na Amazônia Legal (AM, AP, AC, RR, MT, RO, TO, MA), ou seja, um aumento de 15% do número de brigadistas previstos nos estados em comparação ao ano passado”, diz nota do instituto.
Segundo o Ibama à BBC, desde janeiro de 2023 houve aumento das medidas aplicadas pela fiscalização federal para controlar o desmatamento na Amazônia, além 57% das brigadas serão compostas por populações indígenas e quilombolas.
Foto: AP Photo/picturealliance